Esta é uma história verídica, um tanto cômica para falar a verdade, e aconteceu comigo em 2008.
Pois então... Sabe aquelas histórias que você sabe que se contar a verdade, ninguém vai acreditar? Que a mentira passa a ser uma opção viável, que irá provocar menos barulho? Pois é... aconteceu comigo.
Lembro-me, por exemplo, de uma piada que dizia que um homem casado, ao voltar do trabalho para casa em seu carro, tem seu pneu furado. Ao descer para trocá-lo, na chuva, se sujou todo, inclusive de graxa, e a aliança em seu dedo escorregou. Ao tentar correr para pegar, ela caiu em um bueiro e todo o caminho de volta pra casa, já com o pneu trocado, foi refletindo sobre o que dizer para a esposa. Acontece que ela era muito desconfiada e com certeza pensaria que ele havia retirado a aliança para ir pra “zona” e passar parte da noite com outras mulheres. Explicar tudo, tin-tin por tin-tin, tal qual havia acontecido, provocaria uma tragédia, pois sua esposa realmente não acreditaria.
- Sei, sei!! Você sempre inventa essas histórias, estou cheia disso!
Era provavelmente o que ela falaria e uma crise pesada em seu casamento iria começar. Ao chegar em casa, ela se dá conta que o marido não está usando a aliança de casamento; pergunta onde está, e ele, sem pensar duas vezes, diz que retirou a aliança para passar a noite na farra e não sabe onde deixou, no mínimo alguma garota de programa devia tê-lo roubado. A mulher começa a chorar, quer bater no marido, fica triste e diz que vai embora de casa. Pouco tempo depois ela volta de seu quarto mais calma e diz que quer conversar com o marido. Diz que por mais duro que fosse ouvir a “verdade”, ela reconhecia que o casamento ia mal e que se ele foi procurar outras mulheres, talvez seria porque ela não estivesse dando mais tanta atenção para ele.
Resultado: fizeram as pazes e decidiram esquecer o que aconteceu e começar de novo.
Em 2008 eu trabalhava na Biblioteca Central Zila Mamede (BCZM), na UFRN. Era bolsista. Em vocabulário interno, eu era escravo da Escravoteca Central (melodia da abertura de Escrava Isaura). Após 7 meses de trabalho no setor de Circulação (arrumando os livros e estantes e ajudando estudantes a encontrar os livros que procuravam) eu fui chamado para outro setor da Escravoteca: Setor de Informação e Referência (Prestava serviços de informação e cuidava das obras de Referência – dicionários, almanaques, enciclopédias...) Era um setor mais burocrático, em comparação com o trabalho mais maquinal da Circulação.
Entrada da BCZM - Campus da UFRN
Acontece que logo na primeira semana, fui me adaptando ao novo setor com a ajuda da escrava que havia conseguido sua carta de alforria, e logo que fiquei sozinho no setor, como único bolsista do período da tarde, resolvi mostrar um ótimo serviço. Queria mostrar minha competência neste setor, inclusive para causar uma boa impressão a minha nova chefe. Não dizem que a primeira impressão é a que fica! “Não ficar parado!” Era esse o meu lema. Perguntava se precisava de ajuda em algo, ia e vinha lá nas obras de Referência ver se estava tudo OK, e por aí vai. Até que, ainda nas primeiras semanas, aconteceu A situação em que falar a “verdade” pareceria uma maneira de complicar.
Certa tarde, disse a minha senhora chefinha que ia a outro setor da Escravoteca para entregar uns livros de lá. Ela consentiu e lá fui eu, alegremente, distribuindo sorrisos aos usuários e às outras pessoas. Eis que, no caminho, encontro um outro escravo, também do Curso de História (Curso que mais contribuía com o tráfico de escravos para a Senzala Central Zila Mamede) e ele bebia tranquilamente um cafezinho. (Esse escravo tinha me substituído no meu antigo setor, e eu, como um verdadeiro Cavaleiro Jedi, o havia treinado eximiamente para me substituir).
Primeiros bolsistas da BCZM em horário de descanso.
- Tudo bom, Patrício?
- Oi Rodrigo, beleza! Vai um cafezinho?
- Não man, obrigado! Não bebo café.
- Beleza. – (Surge uma garota desconhecida para mim) – Fulana, aceita um cafezinho?
- Ahh, aceito sim, Patrício!
- Opa, vou lá dentro pegar um pra você, espera um minutinho.
- Ok! – Respondeu a garota sorridente.
- Rodrigo?
- Hum?
- Segura esse café pra mim enquanto vou buscar um pra ela?
- Claro!
Ao perceber que estava com uma mão ocupada (com livros, eu acho) e a outra segurando um cafezinho, decidi sentar na cadeira atrás de mim, para esperar meu colega caridoso que foi buscar um cafezinho para a moça. Nesse ínterim de alguns segundos, eis que surge a minha chefinha que ao se deparar com seu único bolsista da tarde (que deveria estar em outro setor entregando livros, mas que estava sentado, segurando um cafezinho) diz triunfante como quem descobre um miraculoso plano para dar uma escapadinha do serviço:
- Rodriiiiigo, tomando um cafezinho, hein? (Sorrisinho malicioso da chefinha).
Eu nem pensei em argumentar. Dizer o que? Que estava esperando Patrício vir buscar o café DELE? Dizer que não tinha mentido pedindo para ir a outro setor e na verdade queria apenas tomar um cafezinho (que nem gosto)? Dizer que era um mal entendido que manchava minha primeira imagem construída de alguém que está trabalhando a plenos vapores? Nãããã... Apenas olhei-a e respondi:
- Pois é... É sempre bom um cafezinho!
A notícia boa é que, apesar da minha chefinha nunca ter conhecimento do que realmente aconteceu, terminamos por nos dar muito bem ao longo do tempo que levei para conseguir minha carta de alforria (um ano e meio mais ou menos, totalizando 2 anos da minha vida como escravo). Apesar de tudo, foi uma boa experiência, contudo, não tinha mais nada pra aprender lá.
O cafezinho que me derrubou...
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Ps: A última enquete foi sobre o rumo das postagens deste Blog. Ganhou, com 33% dos votos a opção: Postagens Diversas (do jeito que está). Qualquer dia uma nova enquete, fiquem atentos!