“Precisa-se
de Novos Escritores!”
Eram
esses os dizeres da nova placa que colocaram no Céu naquela semana estranha.
Alguns anjos que passavam por perto pareciam não entender direito.
“Ordens
do Rafael!”, dizia Ariel com um olhar que não respondia muita coisa.
Os anjos
mais novos não compreendiam porque a placa fora fincada naquela nuvem. Os mais
velhos pareciam um pouco surpresos com a necessidade daquilo. “Geralmente Ele
prefere deixar que, vez por outra, algum deles apareça para uma visita...
Convocação é coisa rara.”, disse Seraphiel. E de fato, parecia uma convocação!
Algo estava acontecendo.
A placa
fincada naquela nuvenzinha, pequena, mas bem consistente, era invisível aos
olhos comuns. Diz-se pelos Céus que a mensagem carrega um pouco do poder do
Criador, e sendo assim, ela chega aos que estão em temporada pela Terra na
forma de inspiração.
Esta não
foi a primeira placa colocada por lá, como bem lembrou Pravuil, arcanjo quase
sempre responsável por fazer os registros delas. “Lembram que há um tempo
precisou-se de algumas belas vozes? E
teve também aquela que convocou alguns de bom humor, e ainda aquela outra que
simplesmente dizia ‘Precisa-se de boas pessoas!’, e como vieram muitos nessa
última chamada...” Os anjos em volta, que pareciam já em uma espécie de
reunião, concordaram e escutavam curiosos as explicações do autor daqueles
novos dizeres. “De qualquer forma, estou cumprindo ordens superiores!”, disse
Pravuil dando um tom de fim de papo.
Fato é
que a placa fora colocada e alguns já esperavam, há alguns dias, a resposta lá
de baixo. A inspiração teria passado despercebida por todos? Não... Era Ele
quem estava convocando. Quem fosse escritor dos bons, perceberia aquela placa,
de uma forma ou de outra.
Eis que
no dia 18 daquele mês (os anjos não conhecem muito os meses terrenos), um
sujeito de óculos quadrados, com aros pretos e já com certa idade terrena, é
pego pelo anjo Gamaliel analisando a placa colocada há uns dias.
“É aqui
que estão precisando de escritores?”, perguntou sorridente o simpático homem.
Gamaliel sorriu em resposta ao homem e deu-lhe um abraço de boas vindas.
Já no
dia seguinte, outro homem foi pego a observar a placa e olhando para os lados
como quem pensa: “É aqui mesmo!”. Mas antes que ele pudesse dizer o que
pensava, lá estava Gamaliel, com as asas ainda por se fechar, e chegando
levemente dizendo-lhe “Sim, é aqui mesmo!”. A aparência deste novo convidado
era também de certa idade, faltava-lhe os cabelos no meio e os que tinha do
lado já eram todos brancos. As sobrancelhas pareciam pedaços de nuvem retiradas
por ele ali da região e colocadas sobre os olhos. Mas eram só sobrancelhas
mesmo. “A placa está fazendo efeito!”, foi o comentário feito por um serafim na
hora de descanso dos anjos daquela região. Alguns ainda estavam curiosos sobre
os que tinham chegado e se ainda haveria de aparecer mais alguém. “Não me foi
pedido para retirar a placa”, disse Pravuil.
Nos dois
dias seguintes, alguns anjos ficaram de plantão próximo da nuvem onde fora
fincada a placa (nem sempre no mesmo lugar, vale lembrar, pois às vezes as
nuvens viajam a uma velocidade que nem imaginamos, mas para os anjos, quase
todo lugar é perto), mas para frustração deles, ninguém mais havia aparecido.
Como que
apenas para contrariar o desejo de quebrar a rotina de alguns anjos mais
desocupados, quando eles pararam de vigiar a placa, exatamente no dia 23, eis
que um senhorzinho, ainda mais velho do que aqueles outros dois, foi pego
abanando e assoprando a base da nuvem que segurava a placa, como que tentando
entender como aquele pedaço de madeira diferente conseguia ficar preso na
nuvenzinha. “Algum problema, meu caro?”, perguntou Pravuil ao simpático senhor.
“Olhe meu amigo, problema mesmo eu já não tenho mais nenhum. Acabei de resolver
tudo! Mas se o senhor puder me ajudar a entender como danado é que esse pedaço
de pau ta enfiado nessa nuvem, eu já me dou por satisfeito!”. O anjo soltou uma
gargalhada e pediu para que o homem esguio o acompanhasse. “Digamos que a nossa
Pedra do Reino lhe dará essa e outras explicações!”.
E os dois
começaram a caminhar pelo nada, juntos, conversando como dois antigos amigos.
No final
daquele dia, Gabriel veio até a pequena, mas consistente, nuvem e retirou a
placa dali. “Parece que esses três grandes, já são o suficiente por hora”, foi
o que o anjo mensageiro pensou.
Rodrigo
Cavalcanti Felipe.
23.07.2014
Em homenagem a João Ubaldo Ribeiro, Rubem Alves e Ariano Suassuna,
que parecem ter percebido a inspiração da plaquinha na nuvem.